Mina é minha cachorrinha poodle de 12 anos . Ela é minha filhinha caçula que não vai crescer nunca.Quem possui animais sabe o que é ser amado de verdade e eu concordo plenamente com uma definição que li há muito tempo atrás: " Alguns anjos não possuem asas. Possuem quatro patas, um corpo peludo, nariz de bolinha, orelhas de atenção, olhar de aflição e carência. Apesar dessa aparência são tão anjos quanto os outros( aqueles com asas) e se dedicam aos seus humanos tanto quanto qualquer anjo costuma dedicar-se. Que bom seria se todos os humanos pudessem ver a humanidade perfeita de um cão."
E por que três tempos de Mina? Bom, na verdade são três textos dedicados a ela. O primeiro escrito em 2007 antes do seu quarto aniversário, o segundo de 2013 quando estava morando na Itália e bateu uma saudade enorme e o terceiro da atualidade quando adotei dois gatos que foram abandonados por uma mulher sem coração que se mudou da vizinhança .
I
4 ANOS
Mina vai fazer 4 aninhos dia 21/10/2007. Muitas imagens e depoimentos reforçam o sentimento imensurável que somos capazes de nutrir quando mergulhamos no universo apaixonante de um cão. Símbolo de fidelidade incondicional e instrumento de aprendizado de vida, muitas vezes são o passaporte de nossas escolhas.
Mina chegou bagunçando minha casa, meus hábitos e minhas idéias. Era tão pequena que fez do meu chinelo sua segunda cama. Desde o primeiro instante adorei aqueles olhinhos brilhantes e me rendi ao choramingo que todo filhote transmite: cuida de mim! Cuidei dela...
Sem que eu percebesse ela foi se chegando cada vez mais. Seguia meus passos, me observava com atenção. O tempo foi passando... Assim como a gente ela foi criando suas manias, demonstrando suas preferências, alegrando e irritando as pessoas. No seio da família estava lá nos bons e maus momentos, sempre compartilhando... Lambe minhas lágrimas e pula comigo nas horas de alegria. Também faz pirraças, mas sempre se aconchega no meu corpo para dormir. E qualquer que seja o estado que eu chegue em casa sou recepcionada como uma rainha.
Mina é realmente minha mina porque ilumina com preciosidade o amor que possuo.
Um grande amigo me disse que "algumas alminhas" nos são destinadas. É verdade. Ela não veio do acaso e sim para me ensinar a amar melhor,
II
Tão longe eu declaro o meu amor por você todos os dias
Eu declaro meu amor a
você todos os dias. Em todos os atos cotidianos e nos pensamentos mais
distantes.
Agora mesmo, tão
longe, eu sei que você pode me sentir. É talvez a única energia que não se
modifica com o tempo. Eu sinto falta de seus olhinhos brilhantes me
acariciando. Sinto falta da sua presença que acompanha todos os meus movimentos
e adivinha meus temores mais secretos e minhas alegrias mais infantis.
Eu declaro meu amor a
você todos os dias. Em todas as cores que vejo, em todos os cheiros que sinto ,
em todos os sabores que provo.
Agora mesmo, tão
longe, eu sinto que você sabe tudo. Eu sinto falta de acariciar teu corpinho
que deixa meus olhos brilhantes de ternura. Eu sinto falta de seguir seus
movimentos e adivinhar seus temores e suas inocentes alegrias.
Tão longe eu declaro
o meu amor por você todos os dias...
III
Reflexões de Mina
Meu
nome é Mina. Sou uma cadela Poodle miniatura de 12 anos com a belíssima cor
Apricot, cor champagne como consta na minha ficha veterinária.
Meu
nome não é uma homenagem a cantora italiana Mina, também não é por causa das Minas
Gerais ou de qualquer mina d`água ou mina de ouro e tão pouco por aquele modo
diferente de se chamar uma garota como naquela canção dos “Mamonas Assassinas”
(“Mina, seus cabelos è da hora”). Sou Mina por causa de uma das principais
personagens do romance Drácula de Bram Stoker, quase uma vampira...
Resolvi
contar minha história por vários motivos, mas principalmente porque fui
surpreendida nesta fase da minha vida com a vinda de dois gatos adotados por
minha mãe, minha dona amada a quem dedico toda a minha fidelidade.
Outro
motivo importante para escrever é o fato de querer registar meus sentimentos.
Minha mãe sempre diz que devemos fotografar nosso corpo e nossa alma. Ela faz
muitas fotos e escreve tudo o que sente. Diz que assim nossa existência será
lembrada.
Eu não sou o primeiro animal que conta sua
história. Flush, um cocker
spaniel, com a ajuda de Virginia Woolf narrou toda a sua
vida ao lado da poetisa Elizabeth Barret Browning e há também figuras famosas
como o gato Garfield e o cachorro Snoopy que estão em jornais, filmes e
mensagens das redes sociais, aliás, existem também alguns animais blogueiros
como o gato Chico do blog “Cansei de ser
Gato”.
Bem, minha intenção não é a fama,
embora nossa raça seja sempre ligada à França e às mulheres sofisticadas e
importantes. Quem não viu nossa representação nos braços da atriz de Hollywood,
Kirsten Dunst quando encenava Maria Antonieta? Realmente somos muito chiques,
mas antes que pudessem me contestar pesquisei minha origem e sei que meus
ancestrais foram cães de pelo enrolado da Àsia que ajudavam no pastoreio e que
imigraram para várias partes da Europa. Dizem que o Poodle seja o mais antigo
Barbet, um cão de pelo enrolado que se espalhou pela França. Rússia, Hungria e
outros lugares, mas que foi a partir da Alemanha que nos tornamos famosos e
populares no mundo todo. Poodle vem da palavra alemã “Pfudel” que significa
“poça d’àgua ou espalhar águas” que traduziam nossas habilidades na água, pois
na França éramos também caçadores de patos antes de sermos adestrados em circos
e tosados com aqueles pon pons nos pés que deixam constrangidos todos nossos
companheiros machos.
Minha vida mudou no aniversário
da filha da minha dona quando eu ainda era um bebê. Fui o presente dela pelos
seus dezoito anos. Meu pai que naquela época ainda era marido da minha mãe me
escolheu no meio de dois irmãozinhos machos e brancos que me ignoravam e me
rejeitavam em suas brincadeiras. Fiquei escondida no banheiro de um clube,
local da festa, até o momento de ser entregue como surpresa a minha suposta
dona. Porém, algumas horas antes, minha mãe apareceu para me conhecer. Veio
linda, perfumada, de vestido vermelho e falando palavras carinhosas. Ela me
pegou no colo e me acariciou de um jeito que imediatamente percebi que a amaria
para sempre e assim eu a escolhi.
Milhões de coisas me aconteceram nestes
anos que passamos juntas: mudamos diversas vezes, de casas e de cidades,
choramos de tristeza e de alegria, passamos por altos e baixos financeiros,
viajamos de carro e de ônibus e eu nunca entendi porque minha mãe não me levou
para viajar de avião quando ela foi para Itália e eu tive que superar meses de
sua ausência e o pior que não foi só uma vez, aliás, detesto quando ela pega aquela mala vermelha e
começa acomodar suas roupas e acessórios. De qualquer forma aproveitei para
entrar na rotina dos meus irmãos que acordavam ao meio dia e passavam a
madrugada estudando. A propósito, sou muito culta. Além de ser poliglota e
entender português, inglês e italiano por causa de minha mãe, sei tudo sobre
Foucault, Pêcheux, Deleuze, Saussure,
Bloomfield, Chomsky, Freud, Lacan e tantos outros por causa dos meus irmãos que
agora fazem doutorado em linguística. Tudo isso não me importa muito, pois o
que gosto mesmo é de dormir depois de um bom sachet de frango misturado na
minha ração e ser muito paparicada por todo mundo. Lembro-me como fui tão bem
tratada quando tive que ser operada de emergência por causa de uma infecção
uterina e mesmo sofrendo fiquei feliz porque senti como todos me amavam naquela
casa, inclusive um amigo de meu irmão que chorou quando me viu toda costurada
um dia depois da cirurgia. As coisas que não gosto todo mundo sabe: tomar banho
no Pet e voltar com lacinhos grudados na minha orelha e de ter meu amor
ameaçado por pessoas estranhas como namorados de minha mãe por exemplo. Também
não gosto de dividir a cama de minha mãe com ninguém, nem mesmo com meus
irmãos. Quando sou contrariada faço xixi na casa toda inclusive embaixo de uma
mesa de centro da sala para dificultar a limpeza. Deixando estes pequenos defeitos
de lado, sou muito meiga e carinhosa.
Bem,
mas voltando aos últimos acontecimentos eu me pergunto a todo instante por que
logo agora que meus irmãos não moram mais com minha mãe eu não tenho o direito
de ser a filha única? Não sei o que fiz de errado para ter que dividir a
atenção de minha mãe com esses “lindos gatos” (comentários de terceiros dos
quais não compartilho). Que culpa tenho eu de uma desumana ter abandonado estas
criaturas que pensam que podem seguir minha mãe pela casa, vasculhar cada canto
pulando em tudo e inclusive terem a audácia de mexer nas minhas coisas, digo
nos meus brinquedos que estão na minha caminha que eventualmente uso. É um
absurdo! Sinto-me indignada e demonstro claramente meu desprazer quando eles se
aproximam de mim ou ficam se esfregando nas pernas de minha mãe... Onde já se
viu?
Eu
sei que eles não são malvados porque hoje mesmo na varanda ficamos os três
tomando um pouco de sol e nenhum deles me deu uma patada, mas a situação está difícil
de engolir. Talvez com o tempo eu me acostume com esta ideia, não sei dizer. O que
posso dizer agora é que minha história não acabou e só posso repetir uma
daquelas frases que os humanos adoram falar diante das coisas inesperadas:
“Quando a gente pensa que já viu tudo nesta vida...”